Sacrifício animal
Sacrif�cio animal � a matan�a ritualizada de um animal e a distribui��o de suas partes entre os seres-humanos e seres sobre-humanos imaginados, � um dos rituais religiosos mais difundidos da hist�ria humana. A pr�tica b�sica, com varia��es locais, aparecem em uma variedade de culturas humanas ao longo da hist�ria; considerando apenas a religi�o antiga do Mediterr�neo, a pr�tica de sacrif�cio animal existe pelo menos desde a Revolu��o neol�tica (cerca de 8 000 a.C.).[1]
Durante a Revolu��o Neol�tica, os primeiros humanos come�aram a migrar das culturas de ca�adores-coletores para a agricultura, levando � dissemina��o da domestica��o de animais. Em uma teoria apresentada no seu livro Homo Necans, o mitologista Walter Burkert sugere que o sacrif�cio ritual do gado pode ter se desenvolvido como uma continua��o de antigos rituais de ca�a, j� que o gado substituiu a ca�a selvagem no suprimento de alimentos.[2]
Pr�-hist�ria
[editar | editar c�digo-fonte]O Antigo Egito estava na vanguarda da domestica��o, e algumas das primeiras evid�ncias arqueol�gicas sugerindo o sacrif�cio de animais v�m do Egito. Os mais antigos cemit�rios eg�pcios contendo restos de animais originaram-se da Cultura de Badari do Alto Egito, que floresceu entre 4 400 e 4 000 a.C.[3] Ovelhas e cabras foram encontradas enterradas em seus pr�prios t�mulos em um local, enquanto em outro local gazelas foram encontrados aos p�s de v�rios enterros humanos.[3] Em um cemit�rio descoberto na Hierac�mpolis e datado de 3 000 a.C., foram encontrados restos de uma variedade ainda maior de animais, incluindo esp�cies n�o dom�sticas, como babu�nos e hipop�tamos, que podem ter sido sacrificados como homenagem a antigos cidad�os poderosos ou enterrados perto de seus antigos propriet�rios.[4] Segundo Her�doto, o sacrif�cio din�stico eg�pcio de animais tornou-se restrito ao gado - ovelhas, bovinos, porcos e gansos - seguindo um conjunto de rituais e regras que descreviam cada tipo de sacrif�cio.[5]
No final da Idade do Cobre em 3 000 a.C., o sacrif�cio de animais havia se tornado uma pr�tica comum em muitas culturas, e parece ter se tornado restrito ao gado dom�stico. Na cidade de Gate, evid�ncias arqueol�gicas indicam que os canaanitas importaram ovelhas e cabras para sacrif�cio, do Egito, em vez de selecionar animais de seus pr�prios rebanhos.[6] No Monte d'Accoddi, na Sardenha, um dos primeiros centros sagrados conhecidos na Europa, a evid�ncia do sacrif�cio de ovelhas, bovinos e porcos foi descoberta por escava��es e indica que o sacrif�cio ritual pode ter sido comum em toda a It�lia por volta de 3 000 a.C. e depois.[7] No assentamento Festo da civiliza��o minoica da antiga Creta, escava��es revelaram bacias para sacrif�cios de animais que datam do per�odo de 2000 a 1 700 a.C.[8]
Antigo Oriente Pr�ximo
[editar | editar c�digo-fonte]Praticamente todo culto do Antigo Oriente Pr�ximo praticava sacrif�cios, o sacrif�cio de animais era aceit�vel, mas o sacrif�cio humano era considerado mais eficaz por raz�es �bvias - os humanos eram os mais valiosos, e portanto o maior dos sacrif�cios.[9]
O sacrif�cio de animais era geral entre as civiliza��es como a antiga Mesopot�mia, Egito e P�rsia, bem como entre os hebreus e ao contr�rio dos gregos, que tinham elaborado uma justificativa para manter as melhores partes comest�veis do sacrif�cio para os humanos reunidos comerem, nessas culturas o animal inteiro era normalmente colocado no fogo junto ao altar para ser queimado, ou �s vezes enterrado.[2]
O animal mais t�pico para o sacrif�cio ocasional a qualquer deus na antiga Mesopot�mia era a ovelha, mas as cabras virgens tamb�m aparecem com certa frequ�ncia. Um curioso substituto para animais vivos aparece em um ritual no qual o deus do sol Samas derrete, ao p�blico presente, uma ovelha em miniatura feita de sebo. Em muitos casos, o sexo do animal era o mesmo que o da divindade que recebia a oferenda; isso n�o parece, no entanto, ter sido uma regra invari�vel. Os deuses podiam receber vacas, ovelhas e at� cabras virgens, e deusas podiam receber bois, bodes, cordeiros ou ovelhas.[10]
Gr�cia Antiga
[editar | editar c�digo-fonte]A adora��o na religi�o grega antiga tipicamente consistia em sacrificar animais dom�sticos no altar, com hinos e ora��es. O altar ficava do lado de fora de qualquer edif�cio do templo e talvez n�o era associado a nenhum templo. O animal, que deve ser um exemplar perfeito de sua esp�cie, � decorado com guirlandas e outros enfeites e conduzido em prociss�o at� o altar, uma menina com uma cesta em sua cabe�a contendo a faca para o sacrif�cio segue a frente da prociss�o. Depois de v�rios rituais, o animal � abatido sobre o altar, uma vez que o animal cai, todas as mulheres presentes "devem gritar em altos e estridentes tons". Seu sangue � coletado e derramado sobre o altar. O animal � massacrado no local e v�rios �rg�os internos, ossos e outras partes n�o-comest�veis s�o queimadas como parte da oferta para a divindade, enquanto a carne � removida para ser preparada para os participantes comerem; os cidad�os mais importantes se alimentam da carne no local. O templo geralmente mantinha a pele, que era vendida aos curtidores. O fato dos humanos aproveitarem mais dos sacrif�cios do que as divindades era frequentemente objeto de humor na com�dia grega.[2]
Os animais utilizados eram, em ordem de prefer�ncia, o touro ou o boi, a vaca, a ovelha (o mais comum), a cabra, o porco (sendo o leit�o o mam�fero mais barato) e aves dom�sticas como galinhas, perus e pombos (mas raramente outros p�ssaros ou peixes).[2]Cavalos e jumentos s�o vistos em alguns vasos no estilo geom�trico (900-750 a.C.), mas s�o muito raramente mencionados na literatura; estes animais foram introdu��es relativamente tardias � Gr�cia, e sugere-se que as prefer�ncias gregas nesta quest�o s�o anteriores. Os gregos gostavam de acreditar que o animal se alegrava em ser sacrificado, e interpretava v�rios comportamentos deles como demonstrando isso. A adivinha��o examinando partes do animal sacrificado era muito menos importante do que na religi�o romana ou etrusca, ou religi�es do Oriente Pr�ximo, mas era praticada, especialmente o exame do f�gado, e como parte do culto de Apolo. Geralmente, os gregos colocam mais f� em observar o comportamento das aves.[11] Para uma oferta menor e mais simples, um gr�o de incenso poderia ser jogado no fogo sagrado[2] e fora das cidades os fazendeiros faziam simples presentes sacrificiais de produtos vegetais quando as "prim�cias" eram colhidas.[2] Embora a grande forma de sacrif�cio chamada de hecatombe (que significa 100 touros) possa na pr�tica, envolver apenas cerca de uma d�zia, em grandes festivais o n�mero de bovinos sacrificados poderia chegar a centenas, e o n�mero de participantes dos festejos ser de milhares. As enormes estruturas helen�sticas do Altar de Hieron e do Altar de P�rgamo foram construídas para tais ocasiões.
A evidência da existência de tais práticas é clara em algumas literaturas gregas antigas, especialmente nos épicos de Homero. Ao longo dos poemas, o uso do ritual é aparente em banquetes onde a carne é servida, em tempos de perigo ou antes de algum esforço importante para obter o favor dos deuses. Por exemplo, na Odisseia de Homero, Eumeu faz orações e sacrifica um porco para seu mestre Odisseu. No entanto, na Ilíada de Homero, que reflete em parte a antiga civilização grega, nem todo banquete dos príncipes começa com um sacrifício.[12]
Citas
[editar | editar código-fonte]De acordo com o relato único do autor grego Heródoto (ca. 484–425 a.C.), os citas sacrificavam vários tipos de gado, embora a oferta mais prestigiada fosse considerada o cavalo. O porco, por outro lado, nunca foi oferecido em sacrifício, e aparentemente os citas eram relutantes em manter porcos dentro de suas terras.
A vítima tem as patas dianteiras amarradas, o sacerdote sacrificador fica logo atrás dela, puxando a ponta do cordão ele joga a besta para baixo; e quando a vítima cai, ele invoca o deus a quem está sacrificando, e em seguida arremessa um laço em volta de seu pescoço, coloca um pequeno graveto nele e gira para estrangular o animal, sem acender fogo ou fazer qualquer oferenda inicial da vítima ou derramando alguma libação sobre ela, depois que a estrangulou e esfolou a pele, o sacerdote começa a cozinhá-la [...] Então, quando a carne está cozida, o sacrificador pega uma primeira oferenda da carne e dos órgãos vitais e lança-os na frente dele.[13]
Roma Antiga
[editar | editar código-fonte]A oferenda considerada mais potente da religião romana antiga era o sacrifício de animais, tipicamente de animais domesticados, como bovinos, ovelhas e porcos. Cada um deles devia ser o melhor exemplar de sua espécie, o animal era limpo, vestido com insígnias sacrificiais e adornado com flores; os chifres dos bois podiam ser folheados com ouro. O sacrifício era destino a obter a harmonização do terreno e do divino, de modo que a vítima deveria parecer disposta a oferecer sua própria vida em nome da comunidade; devia permanecer calma e ser despachada de maneira rápida e limpa.[14]
O sacrifício às divindades dos céus (di superi , "deuses acima") era realizado à luz do dia e sob o olhar do público. Divindades dos céus superiores exigiam vítimas brancas e inférteis de seu próprio sexo: para Juno, uma novilha branca (possivelmente uma vaca branca); para Júpiter, um boi castrado branco (bos mas) somente para o juramento anual dos cônsules. As divindades Di superi que tinham conexões com a terra, como Marte, Jano, Netuno e vários gênios - incluindo os do Imperador - eram oferecidas vítimas férteis. Após o sacrifício, um banquete era realizado; nos cultos de estado, as imagens das divindades honradas ocupavam o lugar de honra nos sofás de banquetes e, por meio do fogo do sacrifício as carnes eram preparadas e consumidas, incluindo as (extas, as entranhas).[15]
Referências
- ↑ Daniel C. Ullucci (1 de janeiro de 2012). The Christian Rejection of Animal Sacrifice. [S.l.]: Oxford University Press. p. 15. ISBN 978-0-19-979172-9 (em inglês)
- ↑ a b c d e f Walter Burkert (1983). Homo Necans: The Anthropology of Ancient Greek Sacrificial Ritual and Myth. [S.l.]: University of California Press. ISBN 978-0-520-05875-0
- ↑ a b Flores, Diane Victoria (2003). Funerary Sacrifice of Animals in the Egyptian Predynastic Period (PDF). [S.l.: s.n.] (em inglês)
- ↑ Traci Watson (2015). «In Ancient Egypt, Life Wasn't Easy for Elite Pets». National Geographic
- ↑ Heródoto, Histórias, 2.38, 2.39,2.40,2.41,2.42 (em inglês)
- ↑ Archaeological Institute of America (2016). «Ancient Canaanites Imported Animals from Egypt» (em inglês)
- ↑ Jones O'Day, Sharyn; Van Neer, Wim; Ervynck, Anton (2004). Behaviour Behind Bones: The Zooarchaeology of Ritual, Religion, Status and Identity. [S.l.]: Oxbow Books. pp. 35–41. ISBN 1-84217-113-5 (em inglês)
- ↑ C.Michael Hogan, Knossos Fieldnotes, The Modern Antiquarian (2007) Arquivado em 2016-04-16 no Wayback Machine (em inglês)
- ↑ Thom Stark (2011). The Human Faces of God: What Scripture Reveals when it Gets God Wrong (and why Inerrancy Tries to Hide It). [S.l.]: Wipf and Stock Publishers. p. 87. ISBN 978-1-60899-323-9 (em inglês)
- ↑ Billie Jean Collins (30 de novembro de 2001). A History of the Animal World in the Ancient Near East. [S.l.]: BRILL. p. 397. ISBN 978-90-474-0091-2 (em inglês)
- ↑ Struck, P.T. (2014). "Animals and Divination", In Campbell, G.L. (Ed.), The Oxford Handbook of Animals in Classical Thought and Life, 2014, Oxford University Press. DOI: 10.1093/oxfordhb/9780199589425.013.019, online (em inglês)
- ↑ Sarah Hitch, King of Sacrifice: Ritual and Royal Authority in the Iliad, online at Harvard University's Center for Hellenic Studies (em inglês)
- ↑ Macaulay (1904:314).
- ↑ Halm, in Rüpke (ed), 239.
- ↑ Scheid, in Rüpke (ed), 263 - 271.
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- Barik, Sarmistha (2009), "Bali Yatra of Sonepur" in Orissa Review, Vol.LXVI, n.º 2, setembro, pp. 160-162.
- Burkert, Walter (1972), Homo Necans pp. 6-22
- Pasayat, C. (2003), Glimpses of Tribal an Folkculture, Nova Delhi: Anmol Publications Pvt. Ltd., Pp. 67-84.
- Pasayat, C. (2009), "Kandhen Budhi" in Orissa Review, Vol.LXVI, No.2, September, pp. 20-24.
- Petropoulou, M.-Z. (2008), Animal Sacrifice in Ancient Greek Religion, Judaism, and Christianity, 100 BC to AD 200, Oxford classical monographs, Oxford University Press, ISBN 9780199218547.