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Apócrifos do Novo Testamento

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Os Apócrifos do Novo Testamento, também conhecidos como "evangelhos apócrifos", são uma coletânea de textos, alguns dos quais anônimos, escritos nos primeiros séculos do cristianismo, vetados no Primeiro Concílio de Niceia, não reconhecidos pelo cristianismo ortodoxo e que, por isso, não foram incluídos no Cânone do Novo Testamento. Não existe um consenso entre todos os ramos da fé cristã sobre o que deveria ser considerado canônico e o que deveria ser apócrifo.

O termo "apócrifos" vem do grego ἀπόκρυφα e significa, justamente, "coisas escondidas". O termo é geralmente aplicado para designar livros que já foram considerados pela igreja como úteis, mas não divinamente inspirados. Assim sendo, referir-se a escritos gnósticos como "apócrifos" pode ser enganador, pois muitos deles não são assim classificados por fiéis mais ortodoxos do ponto de vista doutrinário. A partir do Concílio de Trento, a palavra "apócrifo" adquiriu conotação eminentemente negativa e se tornou sinônima de "espúrio" ou "falso" (vide Cânone de Trento)

O fato de algumas obras serem categorizadas como Apócrifas do Novo Testamento é algo indicativo da ampla gama de interpretações que a mensagem de Jesus provocou. Durante os primeiros séculos da transmissão desta mensagem, um considerável debate se criou para preservar sua autenticidade. Três métodos principais de endereçar esta questão sobreviveram até os nossos dias: ordenação, onde grupos autorizam indivíduos como professores confiáveis da mensagem; credos, onde os grupos definem as fronteiras de interpretação da mensagem; e os cânones bíblicos, que listam os documentos primários que cada grupo acredita conterem a mensagem originalmente ensinada por Jesus. Muitos livros antigos sobre Jesus não foram incluídos nos cânones e hoje em dia são chamados de "apócrifos". Alguns deles foram vigorosamente condenados e suprimidos, sobrevivendo hoje apenas em fragmentos. As mais antigas listas de obras autênticas do Novo Testamento não são idênticas às listas modernas. Como exemplo, o Apocalipse foi durante muito tempo considerado como n�o-aut�ntico (veja Antilegomena), enquanto que o Pastor de Hermas era considerado genu�no por alguns crist�os (e ainda � em alguns ramos da f� crist�), e aparece no Codex Sinaiticus.

Da mesma forma que o Antigo Testamento, a maioria dos livros do Novo Testamento foram aceitos pela igreja logo de in�cio, sem obje��es: os chamados homologoumena. Isso porque os pais da igreja foram un�nimes a favor de sua canonicidade. Os homologoumena aparecem em praticamente todas as principais tradi��es e c�nones da igreja primitiva: eles formam 20 dos 27 livros que entraram no Canon do Novo Testamento.

Ver artigo principal: Antilegomena

As obras que se apresentam como "aut�nticas", mas que n�o obtiveram aceita��o geral de todas as igrejas s�o chamadas de "Ap�crifos do Novo Testamento". Elas n�o s�o aceitas como can�nicas pela maior parte das denomina��es principais do cristianismo. Como exemplo, atualmente apenas a Igreja Ortodoxa da Eti�pia reconhece o Pastor de Hermas, I Clemente, Atos de Paulo e diversos Ap�crifos do Antigo Testamento, textos que as demais denomina��es crist�s consideram como ap�crifos.

A Peshitta sir�aca, utilizada por todas as v�rias igrejas sir�acas, originalmente n�o inclu�a 2 Pedro, 2 Jo�o, 3 Jo�o, Judas e Apocalipse (e este c�none de 22 livros � o que foi citado por S�o Jo�o Cris�stomo - 347-407 d.C. - e Teodoreto - 393-466 d.C. - da Escola de Antioquia).[1] O sir�acos ocidentais adicionaram os cinco livros faltantes ao seu Novo Testamento na era moderna[1] (como a Lee Peshitta de 1823). Atualmente, os lecion�rios oficiais seguidos pela Igreja S�ria Ortodoxa de Malankara e a Igreja S�ria Cald�ia, tamb�m conhecida como Igreja do Oriente (Nestoriana), apresentam ainda apenas li��es sobre os 22 livros da Peshitta original.[1]

A Igreja Apost�lica Arm�nia por vezes j� incluiu a Terceira Ep�stola aos Cor�ntios, mas n�o a lista sempre com os outros 27 livros can�nicos do Novo Testamento. Esta igreja n�o aceitava o Apocalipse em sua b�blia at� 1200 d.C..[2] O Novo Testamento da B�blia copta, adotado pela Igreja do Egito, inclui as duas Ep�stolas de Clemente.

A separa��o atual foi imposta pelo Conc�lio de Trento, convocado pelo Papa Paulo III, representante m�ximo da Igreja Cat�lica, realizado de 1545 a 1563. Mas bem antes disso, os pais da igreja, j� no s�culo II, combateram esses textos nos seus escritos. Eus�bio, por exemplo, os denomina como "totalmente absurdos e �mpios". Desde o in�cio do Cristianismo parece ter havido fraudes. O ap�stolo Paulo, por exemplo, come�ou a assinar suas cartas por causa de textos falsos que circulavam na igreja no j� no s�culo I (II Tes 3:17 e 2:2).

Evangelhos can�nicos

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Ver artigo principal: Evangelhos can�nicos

Dos muitos evangelhos escritos na antiguidade, apenas quatro foram aceitos como parte do Novo Testamento, ou seja, como can�nicos.

Evangelhos da Inf�ncia

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A escassez de informa��es sobre a inf�ncia de Jesus nos evangelhos can�nicos provocaram uma grande demanda entre os primeiros crist�os por mais detalhes sobre os primeiros anos da vida Dele. Esta demanda foi logo suprida por diversos textos do s�culo II d.C. e seguintes, conhecidos como "Evangelhos da Inf�ncia", nenhum dos quais foi aceito no c�non b�blico, embora o grande n�mero de exemplares sobreviventes ateste a sua cont�nua popularidade.

A maior parte deles foi baseada no mais antigo dos evangelhos da inf�ncia, o Evangelho da Inf�ncia de Tiago (tamb�m chamado de "Proto-Evangelho de Tiago"), no Evangelho da Inf�ncia de Tom� e na combina��o posterior de ambos no Evangelho de Pseudo-Mateus (tamb�m chamado de "Evangelho da Inf�ncia de Mateus" ou "Nascimento de Maria e Inf�ncia do Salvador").

Outros evangelhos da inf�ncia entre os mais antigos s�o:

  1. O Evangelho da Inf�ncia Sir�aco (ou Evangelho �rabe da Inf�ncia)
  2. A Hist�ria de Jos�, o carpinteiro
  3. A Vida de Jo�o Batista
  4. O Evangelho Arm�nio da Inf�ncia de Jesus

Evangelhos Judaico-crist�os

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Ver artigo principal: Evangelhos Judaico-crist�os

Seitas judaico-crist�s durante o cristianismo primitivo ainda mantinham uma forte rela��o com o Juda�smo, mantendo a Lei mosaica e utilizavam evangelhos espec�ficos:

  1. Evangelho dos Hebreus
  2. Evangelho dos Nazarenos
  3. Evangelho dos Ebionitas (s�culo II) � uma tentativa gn�stico-crist� de perpetuar as pr�ticas do Antigo Testamento.

Vers�es rivais dos evangelhos can�nicos

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Muitas vers�es alternativas e editadas de outros evangelhos existiram durante os primeiros anos do Cristianismo. Na maior parte das vezes, o texto afirma ser a vers�o mais antiga ou a vers�o que retirou todas as adi��es e distor��es feitas por oponentes �s vers�es mais reconhecidas do texto. Os padres da igreja insistiram que essas eram as pessoas que estavam a fazer distor��es, ainda que nem todos os estudiosos modernos concordem. Ainda � tema de debate se existe ou n�o alguma vers�o mais antiga ou mais acurada dos evangelhos can�nicos. Detalhes de seus conte�dos s� sobreviveram na forma dos ataques feitos a eles por seus opositores e, por isso, � incerto qu�o diferentes eles s�o entre si e mesmo se constituem obras inteiramente diferentes ou n�o. Entre os textos dessa natureza est�o:

  1. Evangelho de Marci�o
  2. Evangelho de Mani, tamb�m chamado de Evangelho Vivo ou Evangelho dos Vivos
  3. Evangelho de Apeles
  4. Evangelho de Bardesanes

Evangelhos de ditos

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Alguns evangelhos tomaram a forma de pequenas logia - ditos e par�bolas de Jesus - que n�o est�o inseridos numa narrativa concatenada:

Uma minoria dos estudiosos considera o Evangelho de Tom� como parte de uma tradi��o da qual os evangelhos can�nicos eventualmente emergiram. Em todo caso, ambos s�o importantes para visualizarmos como seria o te�rico Documento Q.

Evangelhos da Paix�o

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Outro conjunto de Evangelhos se focam especificamente na Paix�o (pris�o, execu��o e ressurrei��o) de Jesus:

Embora tr�s textos tomem para si o nome de Bartolomeu, � poss�vel que ou as "Quest�es" ou a "Ressurrei��o" sejam, na verdade, o desconhecido "Evangelho de Bartolomeu".

Evangelhos Harm�nicos

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Uma quantidade dos textos tenta apresentar uma �nica harmoniza��o dos evangelhos can�nicos que elimine as discord�ncias entre eles e apresente um texto unificado derivado da uni�o de todos. A mais famosa dessas vers�es � o Diatessar�o. De todos os textos sobreviventes, a maioria parece ser uma varia��o do suprimido Diatessar�o.

Textos gn�sticos

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Ver artigo principal: Evangelhos gn�sticos

Na era moderna, muitos textos gn�sticos foram recuperados, especialmente ap�s a descoberta da Biblioteca de Nag Hammadi em 1945. Alguns textos exp�em a cosmologia esot�rica e a �tica defendida pelos gn�sticos. Muitas vezes, isso ocorre na forma de di�logos em que Jesus exp�e seu conhecimento esot�rico enquanto seus disc�pulos fazem perguntas. H� tamb�m um texto, conhecido como Epistula Apostolorum, que � uma pol�mica contra o esoterismo gn�stico, mas escrito de maneira similar aos textos gn�sticos.[3]

Di�logos com Jesus

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Textos sobre Jesus

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Textos setianos sobre Jesus

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Os setianos eram um grupo que originalmente adoravam o b�blico Sete como uma figura Messi�nica, tratando depois Jesus como uma reencarna��o de Sete. Eles produziram numerosos textos expondo a sua cosmologia esot�rica, geralmente na forma de vis�es:

Diagramas rituais

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Alguns dos textos gn�sticos parecem consistir de diagramas e instru��es para uso em rituais religiosos:

Atos Ap�crifos

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Os "Atos de Ap�stolos" eram um g�nero liter�rio durante o cristianismo primitivo, que contava a hist�ria do movimento crist�o ap�s a Ascens�o de Jesus atrav�s das vidas e obras de seus ap�stolos, principalmente S�o Pedro, Jo�o e Paulo, um convertido. O texto chamado Atos dos Ap�stolos atualmente foi inclu�do no c�non b�blico e � a segunda parte de uma obra cuja primeira � o Evangelho segundo Lucas, com ambas dedicadas � Te�filo e com estilo similar.[4]

Entre os ap�crifos, diversos textos tratam da vida subsequente dos ap�stolos, usualmente pontuadas com eventos fortemente sobrenaturais. Existe uma tradi��o de que uma parte deles tenha sido escrito por Leucius Charinus (conhecidos como Atos Leucianos), um companheiro de Jo�o ap�stolo. Os "Atos de Tom�" e os "Atos de Pedro e os doze" s�o considerados tamb�m textos gn�sticos. Ainda que a maioria dos textos tenha sido escrita no s�culo II d.C., pelo menos dois, os "Atos de Barnab�" e os "Atos de Pedro e Paulo" podem ter sido escritos t�o tarde quanto o s�culo V d.C..

Ver artigo principal: Ep�stolas

H� tamb�m diversas ep�stolas n�o can�nicas (ou "cartas") entre os indiv�duos ou para os crist�os em geral. Algumas delas foram consideradas muito importantes pela igreja antiga:

Apocalipses Ap�crifos

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Ver artigo principal: Literatura apocal�ptica

Diversas obras est�o estruturadas na forma de vis�es escatol�gicas, discutindo o futuro, a vida ap�s a morte ou ambos:

Destino de Maria

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Muitos textos (mais de cinquenta) s�o descri��es dos eventos que circundaram o destino variado de Maria ( a m�e de Jesus):

Estes textos, por seu conte�do ou forma, n�o se encaixam em nenhuma das categorias:

Al�m das obras ap�crifas conhecidas, h� tamb�m diversos pequenos fragmentos de textos, partes de obras desconhecidas e de existência incerta. Alguns dos mais importantes são:

Obras perdidas

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Existem diversos textos mencionados em muitas fontes antigas e que seriam certamente considerados parte dos apócrifos, mas nada sobreviveu deles:

Ver artigos principais: Ortodoxia doutrinária e Ortodoxia

Ainda que muitos livros citados aqui sejam considerados heréticos (especialmente os que pertencem às tradições gnósticas), outras não são consideradas particularmente heréticas no conteúdo e são na realidade aceitos como livros de importante valor espiritual. Não são, porém, considerados canônicos.

Entre os historiados do Cristianismo primitivo, estes livros tem valor incalculável, especialmente os que quase entraram no cânon final, como o Pastor de Hermas. Bart Ehrman, por exemplo, diz:

Os vitoriosos nas disputas para estabelecer a ortodoxia cristão não apenas ganharam suas batalhas teológicas, mas também reescreveram a história do conflito. Os líderes posteriores então naturalmente assumiram que os pontos de vista vitoriosos tinham sido abraçados pela vasta maioria dos cristãos desde o início... A prática da falsificação cristã tem uma longa e distinta história... o debate durou mais de trezentos anos... mesmo dentro dos círculos "ortodoxos" havia considerável debate sobre quais livros deveriam ser incluídos [no cânon].
 
Barth Ehrman, Lost Christianities[5].

Os principais evangelhos apócrifos e a razão de sua proibição pela Igreja Católica[6]

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Evangelho Conteúdo Motivo da proibição Descoberta
Evangelho de Pedro Circulou provavelmente no século II, de autoria atribuída ao apóstolo Pedro; conta uma versão diferente da ressurreição de Cristo, que teria sido conduzido ao céu por dois anjos. Foi acusado de ser uma heresia denominada “docetismo”, segundo a qual Jesus era somente espírito. Foi encontrado um fragmento do texto por arqueólogos franceses, na tumba de um monge no Egito, em 1886.
Evangelho de Filipe Circulou no século III, possui histórias que não estão nos demais evangelhos da Bíblia, como a de que Jesus mudava de aparência para conhecer aqueles a quem se revelava. Além disso, sugere seu relacionamento com Maria Madalena. Possui conteúdo gnóstico e afirma que só mulheres virgens entrariam no Paraíso (o que inviabilizaria as famílias) Encontrado em 1945, em meio aos manuscritos enterrados num vaso na Biblioteca de Nag Hammadi.
Evangelho de Maria Madalena Nos poucos fragmentos que restaram, Cristo ressuscitado instrui seus discípulos a espalhar o gnosticismo e avisa que não deixou leis. Também afirma que Jesus transmitiu segredos a Madalena. O texto é gnóstico, foi condenado como heresia Uma parte foi descoberta em um mosteiro egípcio em 1896; outra versão estava na Biblioteca de Nag Hammadi.
Evangelho de Tomé Texto provavelmente do século I, possui 114 frases atribuídas a Jesus; em que Ele afirma que a salvação vem do autoconhecimento e que a centelha divina está em cada um. Contéudo gnóstico Descoberto na Biblioteca de Nag Hammadi em 1945.

Referências

  1. a b c «Peshitta» (em inglês) 
  2. «Confiabilidade» (em inglês) 
  3. James M. Robinson (1990). The Nag Hammadi Library in English (em inglês). [S.l.]: HarperOne 
  4. Hans-Josef Klauck (2008). The Apocryphal Acts of the Apostles: An Introduction (em inglês). Baylor UP: [s.n.] 
  5. Bart D. Ehrman (2003). Lost Christianities (em inglês). [S.l.]: Oxford University Press 
  6. Tabela baseada de informações obtidas da matéria "Um outro Jesus" da Revista Superinteressante (Edição 207 - dezembro/2004): http://super.abril.com.br/historia/outro-jesus-444985.shtml
  • QUÉRÉ, France (introdução). Evangelhos apócrifos. Lisboa: Editorial Estampa, 1991. ISBN 972-33-0780-4
Inclui o texto dos evangelhos apócrifos.