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Thesouro de Nobreza

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Folha de rosto

O Thesouro de Nobreza � um manuscrito datado de 1675, quando durante o reinado de D. Afonso VI, vig�simo segundo rei de Portugal, governava como Pr�ncipe Regente o seu irm�o, o futuro D. Pedro II.

A obra � um armorial, isto �, uma colect�nea de armas her�ldicas, e foi executada por Francisco Coelho, Rei de Armas, no Estado da �ndia, conforme se pode ler na folha de rosto.

Caracter�sticas

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A capa decorada do c�dice do Thesouro de Nobreza

O c�dice do Thesouro de Nobreza cont�m 79 f�lios em pergaminho e papel, nas dimens�es 480 x 350 mm. O livro de Francisco Coelho tem a particularidade de deixar todos os versos dos f�lios em branco. O t�tulo completo da obra � Tombo das Armas dos Reys e Titulares e de todas as Familias Nobres do Reyno de Portugal intitulado com o Nome de Thesouro de Nobreza. A obra encontra-se hoje em Lisboa, no arquivo nacional da Torre do Tombo (cota Casa Real, Cart�rio da Nobreza, liv. 21).

A obra � de certa forma uma continua��o dos importantes armoriais executados por iniciativa de D. Manuel I: o Livro do Armeiro-Mor, de Jo�o do Cr� (1509), e Livro da Nobreza e Perfei�am das Armas, de Ant�nio Godinho (ca. 1521-1541). O primeiro, para al�m de ser o mais antigo armorial portugu�s existente, � uma obra-prima de iluminura her�ldica, com magn�ficas iluminuras de grande beleza; o segundo, apesar de excluir grande parte das armas estrangeiras que o outro apresenta - incluindo mesmo cap�tulos inteiros, como os Nove da Fama - mostra armas de familias n�o representadas no armorial mais antigo, e acrescenta algo importante �s armas portuguesas: os timbres, que o Livro do Armeiro-Mor n�o apresenta.

O Thesouro de Nobreza em compara��o contempla mais t�picos que o Livro do Armeiro-Mor, incluindo v�rias inova��es, como as armas das Doze Tribos de Israel, das Ordens Militares e Religiosas, das cidades e vilas de Portugal, de todos os reis e rainhas de Portugal at� ent�o, e das Casas tituladas de Portugal. Al�m disso, cont�m um numero consideravelmente maior de armas de fam�lia. � assim um armorial mais geral e universal que o Livro do Armeiro-Mor.

A obra foi acabada pouco depois do fim da Guerra da Restaura��o (1640-1668), durante a qual numerosos t�tulos nobili�rquicos criados pelos reis de Espanha foram extintos e novos foram criados para recompensar os apoiantes da causa portuguesa. Um dos m�ritos do Thesouro de Nobreza � reflectir esta evolu��o (ver infra).

No entanto, o Thesouro de Nobreza foi executado numa �poca para a qual o historiador possui j� muitas mais fontes que para o in�cio do s�culo XVI. Assim, e apesar do seu valor enciclop�dico, a obra de Francisco Coelho tem menos valor hist�rico que os armoriais anteriores. Acrescente-se que as armas no livro de Francisco Coelho s�o de uma execu��o bastante mais rudimentar que as dos armoriais anteriores, raz�o por que a sua obra tem tamb�m menos valor art�stico. Para al�m do tra�o grosseiro, a menor nota art�stica � acentuada pelo facto de as armas das fam�lias apresentarem apenas o respectivo escudo, virol e timbre, e nunca o elmo e paquife. As armas das Casas tituladas apresentam o escudo e a respectiva coroa her�ldica. Tendo dito isto, o Thesouro de Nobreza n�o deixa de impressionar pela simples quantidade de armas e a natureza diversa das mesmas.

Cap�tulos da obra

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Armas das Doze Tribos de Israel

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Armas das Doze Tribos de Israel (fl 1r)

(Fl 1r) Este primeiro cap�tulo apresenta a primeira inova��o em rela��o aos armoriais anteriores: as armas - imagin�rias - das Doze Tribos de Israel.

Armas dos Nove da Fama

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Armas dos Nove da Fama (fl 2r)

(Fl 2r) O segundo cap�tulo da obra mostra as armas - quase todas imagin�rias - dos chamados Nove da Fama, nove her�is tidos na Idade M�dia como o ideal do cavaleiro medieval. Estes encontram-se divididos em tr�s grupos de tr�s: os Hebreus, os Pag�os (aqui chamados Gentios), e os Crist�os. Na obra de Francisco Coelho a ordem de apresenta��o � id�ntica � vista no Livro do Armeiro-Mor, que tamb�m lhes dedica um cap�tulo:

Armas e Insignias dos Romanos

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(Fl 3r) Eis outra inova��o interessante na obra de Francisco Coelho: doze armas ou ins�gnias do Imp�rio Romano - algumas hist�ricas, outras imagin�rias.

Armas de varios Reynos

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(Fl 3r-6r) A obra prosegue com uma lista de armas de v�rios reinos, ao modo dos dois armoriais anteriores. No entanto a lista selecionada por Francisco Coelho � bastante original, omitindo muitos reinos �bvios e incluindo muitos que n�o se encontram nas outras duas obras, como no caso dos primeiros tr�s da lista, a Cil�cia, a C�tia, e a Tr�cia. Entre os cap�tulos que os tr�s armoriais t�m em comum, este � certamente aquele em que o Thesouro de Nobreza mais se destaca pela originalidade.

Armas de alguns Senhores e Potentados

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(Fl 7r) Aqui se mostram doze armas francesas, das quais as primeiras nove pertencem a nove dos antigos doze pares da Fran�a (em 1675 existiam j� mais de uma vintena), que todos tinham um papel importante na sagra��o dos reis da Fran�a. Sobre a sagra��o dos reis, o papel dos pares, e ilustra��es ver o Livro do Armeiro-Mor.

Note-se que o armorial de 1509 apresenta as armas dos pares da Fran�a correctamente depois dos sete Pr�ncipes-eleitores do Imp�rio (ver infra), seus superiores na hierarquia nobili�rquica. A raz�o porque Francisco Coelho em 1675 ter� escolhido apresentar as armas francesas antes das alem�s pode reflectir as recentes rela��es entre Portugal e a Fran�a desde a fase final da Guerra da Restaura��o (1640-1668). Note-se que o Pr�ncipe Regente era desde 1668 casado com uma princesa francesa, a futura rainha D. Maria Francisca de Sab�ia, depois do casamento desta com D.Afonso VI ter sido anulado. Do mesmo modo o duque de Cadaval, D. Nuno �lvares Pereira de Melo, o primeiro nobre do reino, tinha ele pr�prio casado em Paris tamb�m com uma princesa francesa em 1671 - e justamente em 1675, depois de enviuvar, casou novamente em Fran�a com outra princesa, parente de Luis XIV. As rela��es entre Portugal e a Fran�a � data da execu��o da obra eram assim excelentes. Sobre este tema, e para um fant�stico testemunho da era em que Francisco Coelho realizou a sua obra, ver a obra de Ana Maria Homem Leal de Faria.[1] Ver ainda coment�rio no cap�tulo das rainhas de Portugal.

Armas dos Sete Electores do Imperio

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(Fl 8r) Este cap�tulo representa as armas dos sete Pr�ncipes-eleitores do Sacro Imp�rio Romano-Germ�nico. O cap�tulo reflecte uma altera��o desde 1509, quando os mesmos foram representados por Jo�o do Cr�: devido � Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), o Eleitorado do Palatinato, que passara ao partido Protestante, foi em 1623 substituido pela Baviera, cujo pr�ncipe se mantivera fiel ao partido Cat�lico. Sobre a elei��o do imperador, os cargos dos v�rios eleitores, e ilustra��es ver o Livro do Armeiro-Mor.

Armas das Ordens Militares & Religi�es Regulares de Portugal

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Armas das Ordens Militares e Religiosas de Portugal (fl 9r)

(Fl 9r-10r) Este cap�tulo � outra inova��o em rela��o aos anteriores armoriais. Ocupando um f�lio inteiro e a primeira fila do seguinte encontramos representadas quinze (dezasseis) ordens militares e mon�sticas:

Armas de algumas Cidades das Conquistas de Portugal

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(Fl 9r) Outro cap�tulo original na obra de Francisco Coelho: oito armas das conquistas de Portugal - tr�s armas do Algarve; as armas do Brasil e de Goa; as das ilhas de S�o Miguel e Terceira nos A�ores; e as da "Ilha do Funchal." Entre todas elas encontramos tamb�m as armas da Ordem dos Cartuxos. Um dos escudos algarvios n�o est� preenchido.

Armas das Cidades de Portugal

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Armas das Cidades de Portugal (fl 11r)

(Fl 11r) Um f�lio com as ent�o doze cidades de Portugal:

Armas das Villas de Portugal que tem Lugar em Cortes

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(Fl 12r-18r) Este cap�tulo do Thesouro da Nobreza ocupa seis f�lios inteiros e tr�s filas de um s�timo e cont�m as armas de 75 vilas portuguesas. Estas eram as que segundo os seus forais tinham direito a representa��o ("lugar") nas Cortes do Reino, e que na sua grande maioria s�o ainda hoje as principais vilas de Portugal, a maior parte delas sedes de concelho. Sete dos escudos t�m legenda, mas est�o em branco: os das vilas de Loul�, Castelo Rodrigo, Alegrete, Fronteira, Veiros, Campo Maior e Monsaraz. O �ltimo f�lio do cap�tulo cont�m doze escudos, mas apenas os tr�s cimeiros foram preenchidos, estando os restantes em branco e sem legenda.

Note-se que este cap�tulo inclui as armas de Oliven�a, cujo estatuto hoje � controverso (ver Quest�o de Oliven�a). Oliven�a � representada no sexto lugar, logo ap�s algumas das vilas mais importantes de Portugal: Santar�m, Set�bal, Tomar (sede da Ordem de Cristo), Guimar�es, e Estremoz, todas elas entretanto elevadas ao estatuto de cidade.

Armas dos Reys de Portugal

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Armas das Rainhas (fl 22r). Na �ltima fila as armas das Princesas e Infantas de Portugal, em lisonja. Note-se as armas da rainha D. Maria Sofia de Neuburgo no �ltimo lugar, executadas j� depois de 1687 (ver infra).

(Fl 19r-20r) Encimadas pelas armas da cidade de Lisboa e do conde D. Henrique temos em dois f�lios a lista de todos os monarcas portugueses at� 1675:

O cap�tulo encerra com as armas do Pr�ncipe de Portugal, do Duque de Bragan�a, e do Duque de Aveiro, todos de sangue real.

Armas das Raynhas de Portugal

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(Fl 21r-22r) Depois dos reis de Portugal a obra de Francisco Coelho apresenta em dois f�lios as armas das rainhas suas mulheres, todas com escudos partidos de Portugal e as armas de seus pais. Um pormenor interessante: a �ltima rainha a figurar no cap�tulo � a alem� D. Maria Sofia de Neuburgo, segunda mulher de D. Pedro II. Ora esta princesa em 1675, quando a obra ficou acabada, tinha apenas seis anos de idade. D. Pedro apenas enviuvou nos �ltimos dias de 1683, e apenas se casou com D. Maria Sofia em 1687, quando j� era rei, pelo que estas armas foram executadas j� depois das restantes do livro.

Armas dos Duques e Marqueses de Portugal

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Armas dos Duques e Marqueses de Portugal (fl 23r)
Armas dos Condes de Portugal (fl 24r)
Armas dos Condes de Portugal (fl 25r)
Armas das Familias (fl 27r). O primeiro de quarenta f�lios apresentando armas de fam�lias portuguesas.

(Fl 23r) O Thesouro de Nobreza chega agora ao corpo da obra: as armas dos Titulares e de todas as Familias Nobres do Reyno de Portugal, come�ando pelos t�tulos cimeiros da hierarquia nobili�rquica portuguesa de ent�o.

Note-se que durante a Guerra da Restaura��o (1640-1668) e nos anos imediatamente a seguir foram extintos 24 t�tulos concedidos pelos Filipes, e 17 novos criados. A partir de ent�o, o n�mero de t�tulos de Portugal permaneu extraordin�riamente est�vel no contexto europeu durante cerca de um s�culo e meio, at� o fim do s�culo XVIII: cerca de meia centena. Em 1640 existiam 56 t�tulos; em 1789, 54. Novos t�tulos nobili�rquicos eram conferidos sensivelmente ao mesmo ritmo que velhos t�tulos se iam extinguindo - na m�dia cerca de quatro em quatro anos.[2] Muitas de estas linhagens foram descritas por Anselmo Braamcamp Freire nos seus Bras�es da Sala de Sintra. Para o per�odo tardo-medieval, ver as obras de Rita Costa Gomes e Jos� Augusto Sotto Mayor Pizarro na bibliografia.

Armas dos Condes de Portugal

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(Fl 24r-26r) Ap�s as armas dos duques e marqueses, este cap�tulo apresenta as armas da quase totalidade dos condados portugueses existentes em 1675.

Note-se no entanto que os seguintes títulos são apresentados no capítulo seguinte:

Armas das Familias

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O capítulo final do Thesouro da Nobreza apresenta, a partir do fólio 27, quarenta fólios com armas de familias nobres portuguesas, todas com o verso em branco. O capítulo inclui a quase totalidade de armas de familia presentes no Livro do Armeiro-Mor e no Livro da Nobreza e Perfeiçam das Armas, e ainda as de muitas outras familias entretanto nobilitadas.

O capítulo segue geralmente a ordem de apresentação dos armoriais anteriores, com as linhagens mais velhas e importantes primeiro - incluindo quatro títulos de conde não mencionados no capítulo anterior, e ainda dois títulos extintos em 1675 (o de Conde de Penela e o de Conde de Linhares).

O fólio 66 apresenta apenas quatro armas, pelo que o total de armas de familia portuguesas neste capítulo do Thesouro de Nobreza é de 472.

Versão digitalizada

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O Arquivo Nacional da Torre do Tombo, no seu site na internet, disponibiliza fotografias digitalizadas do Thesouro de Nobreza em formato TIFF (ver Ligações Externas).

  1. FARIA, Ana Maria Homem Leal de: Duarte Ribeiro de Macedo. Um Diplomata Moderno (1618-1680), e ainda Id.: Os Cadernos de Duarte Ribeiro de Macedo. Correspondência Diplomática de Paris (1668-1676).
  2. MONTEIRO, Nuno Gonçalo: "17th and 18th century Portuguese Nobility in the European Context..." Em comparação, no reino vizinho da Espanha o número de títulos subiu de 144 em 1621 para 654 em 1787. Ibid.
  • Livro da Nobreza e Perfeiçam das Armas (António Godinho, Séc. XVI). Fac-simile do MS. 164 da Casa Forte do Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Introdução e Notas de Martim Albuquerque e João Paulo de Abreu e Lima. Edições Inapa, 1987
  • Livro do Armeiro-Mor (1509). 2.ª edição. Prefácio de Joaquim Veríssimo Serrão; Apresentação de Vasco Graça Moura; Introdução, Breve História, Descrição e Análise de José Calvão Borges. Academia Portuguesa da História/Edições Inapa, 2007
  • FARIA, Ana Maria Homem Leal de: Duarte Riberio de Macedo. Um Diplomata Moderno (1618-1680). Dissertação de Doutoramento. Instituto Diplomático, Ministério dos Negócios Estrangeiros (Lisboa), 2005.
  • Idem: Os Cadernos de Duarte Ribeiro de Macedo. Correspondência Diplomática de Paris (1668-1676). Instituto Diplomático, Ministério dos Negócios Estrangeiros (Lisboa), 2007.
  • FREIRE, Anselmo Braamcamp: Brasões da Sala de Sintra. 3 Vols. 3ª Edição, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1996
  • GOMES, Rita Costa: The Making of a Court Society. Kings and Nobles in late Medieval Portugal. Cambridge University Press, 2003
  • MONTEIRO, Nuno Gonçalo: "17th and 18th century Portuguese Nobility in the European Context: A historiographical overview". e-Journal of Portuguese History, Vol. 1, number 1, Summer 2003
  • PIZARRO, José Augusto Sotto Mayor: Linhagens Medievais Portuguesas: Genealogias e Estratégias 1279-1325, vol. I-III. Universidade Moderna do Porto, 1999

Ligações externas

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